Por – Rodrigo Piazzeta – Buscar soluções para a crise das tarifas através da liberação da exploração primária é enterrar-se em um erro repetido.
Diante da imposição de tarifas de 50% pelos Estados Unidos sobre produtos brasileiros, o já fragilizado setor industrial nacional foi atingido em cheio. A tímida produção manufatureira brasileira tem nos EUA seu principal mercado de destino — e essa dependência revelou, mais uma vez, nossa vulnerabilidade.
Na tentativa de encontrar uma solução para o impasse muitos passaram a ver nas riquezas minerais do país uma espécie de “carta na manga” geopolítica. Gráficos e tabelas inundaram as redes, exaltando o Brasil como segundo maior detentor de Terras Raras do mundo e como potência no fornecimento de nióbio, insumo estratégico para tecnologias de ponta.
Mas ao depositar esperanças em recursos como o nióbio ou as terras raras, o Brasil reincide em um erro estrutural que o acompanha desde o período colonial: apostar na exploração primária como caminho fácil para o desenvolvimento, em detrimento da sofisticação produtiva e da complexidade industrial.
Na economia, esse padrão é bem conhecido. Trata-se do fenômeno chamado Doença Holandesa — expressão criada para descrever os efeitos perversos que a valorização de recursos naturais pode gerar sobre o restante da economia. O caso clássico foi o da Holanda nos anos 1960: a descoberta de grandes reservas de gás natural elevou as exportações e valorizou o florim, tornando os produtos manufaturados holandeses menos competitivos nos mercados internacionais.
Essa história não nos é estranha. O Brasil já passou por episódios semelhantes: o boom das exportações de soja e minério de ferro nos anos 2000 e a descoberta do pré-sal na década seguinte provocaram efeitos colaterais semelhantes — reprimarização da pauta de exportações, enfraquecimento da indústria, concentração de investimentos em setores menos intensivos em tecnologia.
Acreditar que a liberação da exploração de terras raras e do nióbio será nossa “salvação” em meio às pressões comerciais dos Estados Unidos é cair, mais uma vez, na armadilha da dependência do subsolo. Isso pode até aliviar momentaneamente os efeitos do tarifaço, mas não nos livra dos gargalos que realmente importam: baixa produtividade, falta de inovação, desequilíbrios regionais e um sistema produtivo cada vez menos sofisticado.
Muito pelo contrário — a crença de que “o futuro está enterrado” pode atrasar ainda mais a necessária reindustrialização do país e o fortalecimento de cadeias produtivas complexas. A salvação, se vier, virá do investimento em gente, ciência, tecnologia e políticas industriais consistentes — não do extrativismo renovado com verniz estratégico.
Porque nem todo o nióbio do mundo é capaz de nos salvar do subdesenvolvimento. E talvez, ao insistirmos nisso, ele até nos atrase.
